Por Daniel Agapito
Fotos: Belmilson Santos
Que o mês do Rock in Rio é sempre cheio de shows não é surpresa para ninguém, mas setembro de 2024 em São Paulo trouxe uma agenda especialmente intensa para fãs de rock e de metal. Só nas primeiras duas semanas, artistas como Sepultura, Tesseract, Deep Purple, The Weeknd e Travis Scott todos têm marcado presença na capital paulista. No mesmo dia em que Travis Scott, autoproclamado o “mais chapado da sala” (Travis Scott), se apresentava no Allianz Parque, os suecos do Therion, icônica banda de metal sinfônico (e praticamente o oposto musical de Scott), chegavam à cidade para iniciar sua turnê de divulgação de Leviathan III, seu 19º álbum, lançado em 2023, com uma performance enérgica no Carioca Club.
O dia inteiro foi quente, com temperaturas ultrapassando os 30 graus, e o calor só deu uma trégua bem depois do pôr-do-sol. As coisas esquentaram ainda mais por volta das 20h30, quando a “besta selvagem” subiu ao palco: Thomas Vikström, Lori Lewis e Rosalía Sairem nos vocais, Christofer Johnsson e Christian Vidal nas guitarras, Christopher Davidsson no baixo e Sami Karppinen na bateria. O show não foi daqueles que lota logo na abertura das portas; o público foi chegando aos poucos, e a casa acabou abrigando um bom volume de pessoas – não completamente cheia, mas em grande parte ocupada.
O Therion iniciou o show com Seven Secrets of the Sphinx, Crowning of Atlantis e Ruler of Tamag, uma boa mistura de faixas antigas e novas. Isso foi reforçado pelo vocalista, que começou dizendo: “E aí, brasileiros de São Paulo! É ótimo estar de volta, fazia um tempo que não vínhamos. Temos uma noite longa pela frente, tocaremos algumas coisas novas e alguns dos clássicos. Vai ser tipo um churrasco!” . Só pelo uso de termos em português, Vikström já conquistou os fãs, que não estavam tão animados – afinal, era uma quarta-feira, não tinha como ser muito diferente.
Perguntando aos fãs se ainda lembravam de Secret of the Runes, de 2001, a banda anunciou Ginnungagap, o cartão de visitas do álbum. A quinta música do setlist, que não era tocada desde 2005, foi reinserida especialmente para esta turnê e descrita pelo vocalista como “forasteira”. Ele chegou a cantarolar brevemente sua melodia – que esbanja influências árabes e egípcias, algo místico – , o que desencadeou uma reação impressionante do público. A plateia continuou a melodia, e o choque foi geral quando descobriram de qual faixa se tratava: Uthark Runa.
Eles seguiram com uma combinação interessante de músicas mais conhecidas e outras bastante “lado B”, que geraram reações mistas, embora tenham enlouquecido os fãs mais dedicados. Clavicula Nox e a mais “brutal” Typhon – como descrita por Lewis, que não visitava o Brasil desde 2014 – também marcaram presença. Black Sun e El Primer Sol também fizeram parte do repertório, mas o valor que agregaram à apresentação foi ínfimo, já que ambas são pouco conhecidas, exceto por uma pequena parcela do público.
A partir daí, as coisas deram certa engrenada, com várias faixas da nova trilogia sendo executadas – Litany of the Fallen, Eye of Algol, Tuonela e Ayahuasca, entre outras – dando lugar a um bloco que priorizou os clássicos.
Wine of Aluqah, destaque do álbum Vovin (1998) e já tocada mais de 550 vezes pelos suecos, iniciou essa parte do show, seguida de Nightside of Eden. Embora não seja um clássico, esta última é mais conhecida que Mark of Cain, por exemplo. Lewis aproveitou para anunciar a próxima faixa, Quetzalcoatl, como uma peça essencial em seus setlists latino-americanos, não só pela história contada na letra, mas também pela boa recepção que sempre recebe por aqui. Para a trinca final, acertaram em cheio nas escolhas: Lemuria, Sitra Ahra – que teve uma das melhores respostas da noite – e sua “marca registrada” (que confunde todos os fãs de Celtic Frost), To Mega Therion.
Antes dessa música, Cristofer assumiu o microfone e se desculpou por não ter passado pelo Brasil na última turnê, mas afirmou esperar que tivesse se redimido com essa apresentação. Ele também comentou que dispendeu muita energia na criação do setlist, tentando incluir uma variedade de músicas. Em tom provocativo, elogiou o público mexicano e mencionou que estava com grandes expectativas para os shows no México, que aconteceriam no final do mês, chegando até a perguntar quem ganharia em uma partida de futebol: Brasil ou México. No final, conseguiu fazer o público gritar o nome da música, mas, em retrospecto, o comentário sobre a seleção não foi oportuno, já que que os canarinhos haviam perdido para o Paraguai na noite anterior.
Para o bis, The Rise of Sodom and Gomorrah foi a escolhida, levando os fãs à loucura desde a primeira arcada de violino. Vale destacar que, durante o show inteiro, o baterista estava “comendo” algumas notas, o que impactou significamente a energia das músicas, já que o Therion não é o tipo de banda que faz muito mais que o mínimo na percussão. Para encerrar a noite, tocaram Son of the Staves of Time, seguida dos tradicionais “Thank you, São Paulo” e foto com o público.
Musicalmente, tudo estava impecável, mas, fora os vocalistas, que claramente demonstravam estar felizes, sorrindo e interagindo com os fãs, parecia faltar um certo brilho no resto da banda – e, literalmente, a iluminação estava tão baixa que, da frente da casa, mal se via o baterista, nem se conseguia ler o nome da banda no backdrop. Parecia que estavam ali apenas para cumprir tabela, batendo ponto. Christofer Johnsson tocou bem, sem dúvida, mas sua cara de poucos amigos transmitia uma energia nada contagiante.
Convenhamos, um show numa quarta-feira, às 20h30 da noite, não é o cenário mais animador do mundo, mas será que custava tanto não aparentar que só queriam terminar logo e ir para casa? Resumindo, não foi um show ruim, de forma alguma, mas também não o consideraria excepcional. Musicalmente muito sólido, com um repertório confuso e, definitivamente, longo demais – duas horas e vinte minutos de show é muito, para qualquer banda. Em termos de performance… talvez, se fosse em uma sexta ou sábado, a vibe fosse outra, mas, do jeito que foi, acabou sendo apenas um do show “água em temperatura ambiente”. Como me disse um amigo ao final do show: o Therion já não é uma banda com muitas músicas que animam, e, tocando várias mais “lado B”, não havia muito o que fazer. Para quem é realmente fã da banda e conhece a discografia, foi uma baita noite. Para quem não conhece tudo, foi fácil se perder.
Therion – setlist:
Seven Secrets of the Sphinx
Crowning of Atlantis
Ruler of Tamag
Ginnungagap
Ninkigal
Uthark Runa
Clavicula Nox
Typhon
Black Sun
El Primer Sol
Litany of the Fallen
Eye of Algol
Mark of Cain
Tuonela
Ayahuasca
Wine of Aluqah
Nightside of Eden
Quetzalcoatl
Lemuria
Sitra Ahra
To Mega Therion
Bis
The Rise of Sodom and Gomorrah
Son of the Staves of Time
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