Por Nelson Souza Lima
Tim “Ripper” Owens já estava com o jogo ganho ao subir no palco do Manifesto Bar no último dia 22 de setembro (domingo). No repertório do vocalista estavam alguns dos maiores clássicos de Ronnie James Dio, Judas Priest, Rainbow e Black Sabbath. Aí era só correr para o abraço. Antes, porém, o americano se apresentou em Florianópolis (SC) e Brasília (DF). No Manifesto, cumpriu o prometido e, em pouco mais de duas horas, deixou claro por que está entre as grandes vozes do heavy metal.
Fã assumido do saudoso Ronnie James Dio (influência para 10 entre 10 vocalistas do metal), Ripper esbanjou carisma e bom humor no encerramento da “Stand Up and Shout Tour”, homenagem o vocalista, falecido em 16 de maio de 2010. Para acompanhá-lo, uma excelente banda formada pelos brasileiros Kiko Shred e Rafael Sousa (guitarras) Will Costa (baixo – e um verdadeiro clone de Cliff Burton) e Lucas Tagliari (bateria).
Apesar da noite fria, um bom público compareceu ao Manifesto saudando Owens calorosamente. A abertura dos trabalhos ficou por conta dos paulistanos da Venomous. Lançando seu segundo álbum, “The Black Embrace”, o quinteto faz um melodic death metal/thrash bacanudo e que é mesclado com ritmos brasileiros. Forte presença de palco e a poderosa garganta de Tigas Pereira evidenciam que a Venomous é excelente representante do underground brasileiro. Integram o grupo Gui Calegari e Ivan Landgraf (guitarras), Renato Castro (baixo) e Lucas Prado (bateria).
Em pouco mais de meia hora os caras detonaram um set list porrada na moleira. Do álbum de estreia, “Defiant” (2018), mandaram “Martyr”, “Clycle’s End”, “A New Beginning” e “Green Hell”. E de “The Black Embrance”, a ser lançado em 9 de outubro, tocaram “Penitence”, “Event Horizon”, além da faixa-título. O quinteto é avassalador no palco, tendo um trabalho de guitarras preciso, com solos e riffs matadores, além de uma cozinha coesa, segurando o ritmo. À frente deste trator sonoro, Tigas Pereira sabe o que faz e consegue trazer o público na mão. Aliás, após a apresentação, fui conversar com o vocalista, que contou que souberam do convite para abrir o show de Owens um dia antes. “André (Manifesto) me ligou perguntando se toparíamos abrir. Eu falei que não estávamos ensaiados, mas não dava para perder esta. Encaramos e foi legal”, contou.
Sobre os planos futuros da Venomous Tigas falou que estão indo para a Europa numa turnê de dezessete shows passando pela França, Portugal, Alemanha, Espanha e Suíça. “Vamos dar um rolê pelo Velho Continente, terminando na Bélgica”, afirmou. As influências de ritmos brasileiros é nítida na sonoridade da Venomous, “Green Hell”, por exemplo tem uma levada de Maracatu. “Fizemos no primeiro CD e no ‘The Black Embrance’ também tem influências brasileiras, como Chorinho. Muita coisa legal. Nós miramos o mercado internacional, contudo não esquecemos nossas raízes. Angra e Sepultura, as duas bandas brasileiras que mais se destacaram lá fora, usaram ritmos brasileiros também. Sabemos que não tem como agradar todo mundo. Fazemos música de coração. Tem peso e tudo o mais que o headbanguer tradicional gosta”, atesta Tigas Pereira.
Aí foi esperar por Ripper Owens e companhia. Faltando dois minutos para 21h, a banda entrou, saudada pelo público que ovaciou “Ripper”, “o estripador”. A pancadaria começou com “Stand Up and Shout”, clássico de Dio do álbum “Holy Diver” (1983), e “Painkiller”, do Judas Priest, de 1990. Lembrando que “Painkiller”, o disco, foi o último com Rob Halford antes de se aventurar em carreira solo nos anos 90. Ripper Owens o substituiu entre 1996 e 2003, gravando com o Priest os discos de estúdio “Julgulator” (1997) e “Demolition” (2001). Claro, músicas de ambos estavam no set list. De “Julgulator”, mandaram “Burn In Hell”, e de “Demolition” detonaram “One on One” e “Hell Is Home”. Ripper não cansou de saudar o público e dizer como se sente bem no Manifesto que, para ele, é praticamente sua casa em solo brasileiro. Muitos gritos inflamados dos fãs, mãos chifradas e bate-cabeça à vontade, como manda a boa “cartilha do metal”.
As duas horas e pouco passaram rápido e, entre tantos pontos positivos, três merecem destaque: a versão acústica de “Rainbow in The Dark”, outro clássico de Dio, na qual Owens cantou acompanhado apenas por Shred; a pancada “Long Live Rock’ n’ Roll”, do Rainbow, de 1978, teve solos marcantes dos músicos com refrão gritado a plenos pulmões pelo público; e “Living after Midnight”, do Judas na qual o vocalista tocou guitarra. Muito descontraído ao empunhar a guitarra de Rafael Sousa, o americano brincou dizendo que não aprendeu a tocar muitas músicas inteiras e mandou trechos de “Highway To Hell’ e “Still Loving You”. O cara é uma figura, e mostrou estar tocando mesmo entre amigos.
No total foram quatorze porradas, que incluiu também canções do Black Sabbath da fase Ronnie James Dio, como “The Mob Rules” e “Heaven and Hell”, que encerrou a apresentação. Aquela noite em que tudo deu certo: grande vocal, excelente banda e set list inesquecível.