Formada na cidade de Perth, em 1999, a banda Voyager vem de uma região praticamente isolada do resto da Austrália e, como eles mesmo dizem, do mundo. Apesar de viverem cercados por quase dois milhões de pessoas em sua região, o grupo demorou para ter uma formação estável e já passou por várias mudanças. A sonoridade e produção de seus discos também evoluiram. Com quatro álbuns lançados, Daniel Estrin (vocal e keytar), Simone Dow (guitarra), Scott Kay (guitarra), Mark Boeijen (baixo e vocal) e Alex Canion (bateria) têm apresentado um Prog Metal coeso, pesado e com melodias vocais um tanto diferentes de outras bandas do estilo. Ao definir uma sonoridade própria, os australianos agora se preparam para conquistar novos fãs e durante a passagem deles pelos Estados Unidos ao lado do Rhapsody Of Fire, a ROADIE CREW conversou com eles para saber mais sobre a carreira e a cena Metal australiana.
Primeiramente, gostaria de saber como é estar nos Estados Unidos pela segunda vez?
Simone Dow: Incrível!!! (risos) Tivemos ótimos momentos da última vez, quando fomos convidados para tocar no ‘ProgpowerUSA’ ano passado. É a realização de um sonho poder voltar para fazer uma turnê de dezessete shows.
Alex Canion: Os fãs americanos são muito leais e calorosos, eles nos receberam de braços abertos… e pernas abertas, também!
Simone: (risos)
Mas quem os recebeu de penas abertas? Homens ou mulheres?
Alex: Ambos! (risos)
Simone: (risos) Eles nos trazem cerveja, é incrível. Isso acontece ocasionalmente quando tocamos no leste da Austrália, mas não como aqui! (mais risos).
Falando em Austrália, como é a cena Metal do seu país?
Alex: Nós vivemos em uma cidade que é muito isolada, estamos a pelo menos quatro horas de avião de qualquer lugar. A cena em Perth é um pouco fechada, mas bandas muito boas têm surgido mas, devido à distância, algumas pessoas acham que é difícil conseguir mais fãs. Temos a sorte de poder tocar em outros países e também de fazer turnês pela Austrália. No lado leste as coisas são melhores. Em Brisbane a cena é boa, mas acho que em Melbourne e Sydney as coisas são melhores porque são cidades muito populosas e a cena nessas áreas acabam não sendo tão fechadas. Em várias comunidades existe uma certa politicagem e isso prejudica tudo.
Logo, o melhor lugar para se fazer uma turnê é na costa leste.
Alex: Sim, e é por isso que muitos fãs de Perth ficam irritados. Quando você coloca na balança o preço de passagens aéras, o tempo e tudo mais, a coisa fica impraticável. Perdemos vários shows. O lado bom é que a companhia que nos empresaria tem trazido várias atrações internacionais e como eles são de Perth, a tendência é de que as chances de vermos uma atração internacional é maior.
Qual a média de público nos show de Metal em Perth?
Simone: Algo entre 250 e 500 pessoas. Se for o lançamento de um CD a tendência é atrair mais pessoas; se for apenas um show normal, é claro que haverá menos gente. Obviamente você precisa divulgar o show, fazer propaganda, mas não espere que as pessoas simplismente apareçam.
Ainda sobre Perth, existe alguma diferença de tratamento entre vocês e alguma banda internacional? Os fãs locais dão o mesmo tipo de suporte?
Alex: (pensativo) As pessoas costumam ir aos show mas não necessariamente dar aquele suporte para uma banda local. Nós temos a sorte de ter fãs muito leais. Vale mencionar que abrir shows para bandas como Nightwish, Children Of Bodom, Alestorm ou Steve Vai foi muito benéfico, porque trouxe mais exposição e, consequentemente, fãs. Apesar de viverem na mesma cidade, alguns nem sabiam da nossa existência!
Vocês fazem parte de uma banda de Metal que não tem um número absurdo de fãs e vivem em uma cidade praticamente isolada. Financeiramente falando, como vocês fazem para as coisas acontecerem?
Mark Boeijen: Olha, dessa vez as coisas foram bem desafiadoras, tivemos que fazer de tudo pra que fosse possível fazer a turnê. As verbas de incentivo cultural do governo não vieram e como queríamos muito fazer a turnê, acabamos dando um jeito.
É bom salientar que esse lado eletrônico de vocês é feito basicamente por sintetizadores.
Simone: Não é nada diferente do que o Soilwork faz. É uma banda que faz uso de sintetizadores e é ótimo, eu gosto muito.
Existe então um apoio financeiro oferecido pelo governo?
Simone: Normalmente sim. O Departamento da Cultura e das Artes cuida disso. Uma vez por ano eles proporcionam uma verba grande para um projeto e alguns incentivos menores que se obtém a confirmação rapidamente. Esse apoio tem sido muito bom para nós, eles nos ajudaram nos álbuns e turnês no passado. Dessa vez algo mudou no processo e então divemos que nos virar sozinhos. De qualquer forma, essa ajuda foi excelente. Você preenche uma aplicação e recebe o dinheiro; o montante que eles decidirem e você se vira com o que tem. Claro que temos que prestar contas e provar onde esse dinheiro foi gasto.
Alex: A intenção deles é incentivar a música criada em Perth, querem que ela circule pela Austrália e pelo mundo.
Simone: Eles querem promover a Austrália e isso é muito positivo. Faz as pessoas quererem ver o que se passa no nosso país!
E a venda de música ainda rende algo?
Alex: A nossa gravadora tem dado umbom suporte. Tem fãs que preferem ter o CD em mãos, outros optam apenas por comprá-las digitalmente. Desde que a veia continue pulsando, que os fãs comprem continuaremos fazendo isso até quando podermos.
A Austrália revelou para o mundo o AC/DC, Jet, Rose Tattoo, Midnight Oil, INXS… Qual é o espaço que o Metal tem em seu país?
Mark: Às vezes esquecemos que o AC/CD é australiano (risos). Eles parecem representar uma força internacional.
Simone: Algumas bandas de Metal Progressivo de Perth parecem estar se dando bem. O Metal Extremo, de bandas como Psycroptic, também está tendo bons resultados. É muito trabalho árduo, nada acontece da dia pra noite. Vários festivais como ‘Soundwave’ tem acontecido e eles costumam colocar bandas locais para tocar. Tudo isso é positivo e ajuda.
Como tem sido a resposta do público nessa sua segunda passagem pelos Estados Unidos?
Alex: Temos tido uma resposta muito positiva e isso é uma sinal de que estamos fazendo a coisa certa e de que eles nos querem aqui. Também conseguimos novos fãs. O objetivo dessa turnê é semear o terreno para que possamos voltar mais e mais vezes. Quanto ao show, nós amamos conhecer os fãs, conversar com eles. Isso é um parte muito importante do sucesso. Fazemos o melhor pra retribuir o suporte que as pessoas nos dão.
Simone: Gostamos de conversar com as pessoas, seja na área de mechandising, no bar, em frente o nosso ônibus…
De qual parte do mundo vocês têm recebido a melhor resposta?
Alex: É engraçado você perguntar isso. Inicialmente achamos que a Europa seria o nosso alvo, que o nosso mercado era o europeu. Pois eis que tocar no ‘Progpower USA’ em 2011 mudou tudo isso. Tivemos uma resposta incrível e imediata. Durante o ‘Progpower’, ficamos dando autógrafos durante uma hora e meia. Ficamos muito honrados e felizes. Para essa turnê sei de pessoas que dirigiram horas pra nos ver. O mercado norte-americano está se abrindo para nós! Para ser honesto queremos tocar em todos lugar, desde que possamos cobrir os gastos ou pelo menos empatar, sabe? Eu gostaria muito de ir para a América do Sul, pois acredito que as pessoas amam o Metal. Até o Sul da Ásia também está se abrindo – Indonésia, Bahli e até a Índia tem tido grandes festivais. Esses lugares tem sido deixados de lado por anos e agora estão se abrindo para milhares de fãs. Queremos passar pela Europa no final desse ano. Com isso, deixamos a Austrália um pouco de lado, mas também faremos o máximo de shows que pudermos em casa.
Vocês já passaram pelo Japão?
Alex: Ainda não. O nosso primeiro álbum deve distribuição japonesa, mas nunca tivemos a oportunidade. Trata-se de um mercado bem segregado, precisamos de mais exposição para entrar nele.
Os trabalhos para o novo álbum já estão em andamento?
Mark: Sim! Essa é provavelmente o que mais gosto sobre estar numa banda. Essa também é a primeira vez que tenho a oportunidade de compor com eles. As músicas estão interessantes. Bem pesadas, progressivas e difíceis de tocar.
Simone: (risos) Ao invés de seguir a mesma direção do último álbum, ‘The Meaning Of I’, estamos buscando evoluir, amadurecer. Temos três músicas escritas até agora. Na verdade esamos concentrados em promover o último disco, que saiu ano passado. Não estamos nos pressionando, as composições surgirão naturalmente.
Vocês compõem juntos ou compartilhando arquivos pela internet?
Simone: Tem sido diferente dessa vez. Normalmente Daniel faz a base, o esqueleto da música e nós adicionamos partes, colocamos a nossa interpretação. As coisas mudaram um pouco desde que escrevemos o último álbum, estamos fazendo jams e todos estão colaborando!
Qual seria a definição do título do seu último álbum, “The Meaning Of I” (‘O Significado Do Eu’)?
Alex: É um álbum bem introspectivo onde Daniel escreveu as letras. É como uma autoreflexão, uma autocompreensão. Muita coisa nesse álbum pode ser interpretada individualmente e eu acho isso legal.
A música “Lost” é provavelmente a mais conhecida do Voyager e uma das razões para isso foi a versão remixada que Daniel fez dela. Existe a possibilidade de vocês trazerem elementos eletrônicos nesse novo disco?
Alex: O Daniel tem o lado DJ dele e sempre incentivou o uso de elementos eletrônicos no som do Voyager. Nós achamos interessante esses elementos eletrônicos no som, pois adicionam uma nova dinâmica no Metal que não são frequentemente expolarados. Nós fazemos pela música, não colocaremos nada que soe fora de lugar. Nós inclusive tivemos a ideia de ter todo o ‘The Meaning Of I’ remixado por diferentes DJs. Bem, a música ‘Stare Into The Night’ é um exemplo de uma composição inicialmente eletrônica que tornou-se uma música do Voyager. Daniel a escreveu e quando nos mostrou achamos tão boa que decidimos gravá-la. Adicionamos baixo, bateria, guitarra… Gostamos muito quando Daniel traz esses novos elementos que despertam a curiosidade das pessoas e as fazem querer descobrir mais sobre a banda.
É bom salientar que esse lado eletrônico de vocês é feito basicamente por sintetizadores.
Simone: Não é nada diferente do que o Soilwork faz. É uma banda faz uso de sintetizadores e é ótimo, eu gosto muito.
E qual a reação das pessoas quando veem Daniel tocando o seu Keytar?
Simone: Eles amam! Primeiramente rola aquele espanto, mas logo as pessoas se entregam.
Alex: No ano passado o Alestorm estava na Austrália e em seu últiimo show em Melbourne, Christopher (Bowes, vocal e teclado) e Daniel fizeram um duelo de Keytar e os fãs foram à loucura! No Voyager nos levamos a sério com relação a música, mas na hora da performance queremos nos divertir. O Keytar é uma coisa bizarra dos anos 80, mas conseguimos fazer com que funcionasse no Voyager.
Mark: Além disso, permite que ele se mova pelo palco. É bem melhor que ter trê teclados empilhados e você mal ve os olhos dele por trás do equipamento.
Já que os anos 80 entraram no assunto, de onde surgiu a ideia do ‘medley’ que vocês fazem? (N.R.: no show com o Rhapsody Of Fire eles tocaram “Ghostbusters”, “Highway To Hell” (AC/DC), “Law And Order”, “Pulp Fiction”, “Beverly Hills Cop”, “America Fuck Yeah!”, “Raining Men”, “Jump” (Van Halen) e “Breath”)
Simone: A ideia é antiga. Acho que Daniel veio com essa ideia, eu lembro de ver o Voyager fazendo ‘medley’ antes mesmo de eu entrar para a banda. (risos)
Alex: Eu vi eles tocando o tema do seriado ‘Os Simpsons’ e achei incrível! É uma ótima mandeira fazer com que as pessoas se familiarizarem conosco. Abre a cabeça das pessoas.
O Voyager passou por várias mudanças em sua formação. Como está a situação atual?
Simone: Acho que essa é a melhor formação que a banda já teve e não me refiro apenas em termos musicais. Temos os mesmo interesses, estamos todos em sintonia e nos divertimos. Você passa por aquele estresse quando está espremido numa van, mas um acaba ajudando o outro a superar isso. Nós dificilmente discutimos, isso é bem incomum. (risos)
Simone, como é ser uma guitarrista num meio predominantemente masculino?
Simone: Tem sido difícil. Foi complicado ser levada a sério no início mas, honestamente, as coisas melhoram nos últimos anos. Antes as pessoas perguntavam se eu era a vocalista, baixista… Acho que eles não imaginavam que uma mulher poderia tocar guitarra. (risos) Eu chegava a ficar nervosa e fritava o braço da guitarra para mostar que sabia o que estava fazendo, mas hoje as coisas melhoraram. Conforme fui amadurecendo, me preocupei em tocar, fazer o que amo e não me importo mais com isso. Além disso, tenho tido uma resposta positiva de fãs que me procuram no final dos shows e dizem que se sentem inspirados. Dei algumas entrevistas para resvistas especializadas e fui convidada a participar de um livro abordando mulheres dentro do Metal, que está sendo elaborado pela escritora Jill H. Kirkland.
O que vocês fazem quando o Voyager termina uma turnê? Como vocês se sentem?
Alex: É difícil e eu odeio! Acho que posso falar isso por todos. O ideial seria poder fazer uma turnê de uns dois meses, para por um mês e logo voltar pra estrada.
Mark: Para mim, a maneira mais fácil de encarar isso é não parando. É chegar da turnê, pegar um táxi e ir trabalhar. Eu leciono design gráfico na universidade e Scott dá aulas de guitarra.
Simone: Daniel trabalha na advocacia. Já Alex e eu trabalhamos numa companhia de seguros.
Alex: Os nossos chefes sabem que tocamos, que levamos isso muito a sério e nos dão todo apoio!
Simone: Eles inclusivem aparecem nos shows e fazem parte da nossa vida musical. Claro que várias vezes temos que nos afastar do trabalho sem receber um centavo, mas faz parte.
Scott Kay: É, voltar a normalidade é complicado. (risos)
Site relacionado: https://www.facebook.com/voyageraustralia
Discografia: Element V (2004)
uniVers (2007)
I am the reVolution (2009)
The Meaning of I (2011)