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WOLFHEART: OS LOBOS DE CARÉLIA E OS REIS DO NORTE

Por Valtemir Amler

Depois de revelar ao mundo alguns dos atos musicais mais grosseiros e viscerais de que se tem notícia na virada dos anos 80 para os 90 (quem aí também lembra da impressão devastadora ao ouvir Beherit e Demilich pela primeira vez?), a Finlândia finalmente começou a revelar alguns nomes mais aprazíveis para ouvintes mais sensíveis nos anos 90, com o sucesso mundial de nomes como Stratovarius, Sonata Arctica, Nightwish e tantos outros. Se os nomes melódicos não paravam de somar por lá, os absurdamente extremos também não sinalizavam nenhum arrefecimento, garantindo a Terra dos Mil Lagos um dos cenários mais valorosos do metal mundial. Fato é que chegou um dia que o inevitável aconteceu: o impalatável se uniu ao palatável, e bandas como o Wolfheart nasceram, trazendo o melhor equilíbrio entre os dois mundos em sua fórmula musical. Quando fundou a banda em 2013 em Lahti, o guitarrista e vocalista Tuomas Saukkonen já colecionava uma longa experiência com várias outras bandas, e após simplesmente abandonar todas elas, fundou aquilo que seria uma ‘one-man-band’, ou um projeto solo, como preferir chamar. Fato é que não demorou muito para ele perceber o potencial que aquelas músicas apresentavam, e a necessidade de levá-las aos palcos logo o fez mudar de postura, buscando um time de músicos talentosos para completar a banda. Hoje acompanhado por Joonas Kauppinen (bateria), Lauri Silvonen (baixo) e Vagelis Karzis (guitarra, que já tocou com o Rotting Christ), Tuomas lidera uma banda experiente e conhecida em todo o mundo, e que contabiliza seis álbuns completos de estúdio. Confira o que ele tinha para nos contar abaixo.

Quando você coloca em mente que vai trabalhar em um novo álbum, o que costuma trabalhar primeiro, as letras ou as músicas?

Tuomas Saukkonen: Eu sempre senti a necessidade de ter a música primeiro. De alguma maneira, isso soa mais natural para mim. Ao mesmo tempo, é complicado, pois antes de tudo me vêm à mente essa imagem, como se fosse o cartaz de um filme antigo ou algo do tipo, e nessa imagem existe uma ideia geral do conceito que será abordado no novo álbum. Então, falando de forma mais assertiva, primeiro tenho uma ideia bem geral e totalmente aberta de qual será o conceito do álbum, e então começo a trabalhar na música, e só no fim me debruço seriamente sobre o conceito para criar as letras.

Essa é uma maneira um bocado diferente daquela que costumamos ouvir, especialmente naquilo que se refere a ideia inicial do conceito. Não lembro de outras bandas terem me dito algo do tipo antes.

Tuomas: É, acho que é um pouco diferente, mas sempre foi assim que funcionou quando se trata do Wolfheart. Eu realmente preciso ter essa imagem inicial em mente, pois é a partir dela que começarei a criar as músicas, e elas precisam estar conectadas a essa imagem, precisam ter o mesmo sentimento, o mesmo clima da imagem que tenho em mente. Então, se a imagem inicial é algo como o cartaz de um filme, a música que vou criando é como se fosse a trilha sonora para esse filme, entende?

Sim, e acho essa uma ideia bem legal para capturar um ambiente diferente em cada disco.

Tuomas: Sim, e essa é de verdade a única maneira que funciona para mim. Nem tento escrever de outra maneira, pois sei que ficaria travado em uma mesma ideia por dias e jamais estaria satisfeito com o resultado. Posso ser meio cabeça-dura nessas horas (risos). Outra coisa é que sempre costumo escrever as letras quase que de última hora, quando já estou quase entrando no estúdio para gravar os vocais. Sempre senti que essa é a melhor maneira de manter a emoção genuína que aquelas letras me causam, a forma original como elas me impactam. Escrever tudo muito antes meio que deixaria o meu cérebro anestesiado até o dia de gravar a voz, acostumado demais, e não gosto disso, não gosto de amortecer o impacto, por assim dizer. Simplesmente não faz sentido para eu colocar tanto trabalho para criar a música e as letras com o ambiente perfeito e então perder tudo na hora da gravação.

Confesso que esse é um processo bem mais legal do que eu havia imaginado.

Tuomas: Que bom que apreciou, de verdade. Normalmente as pessoas só me acham esquisito, então é legal encontrar alguém que viaja nas mesmas ideias (risos gerais).

Bem, um dos aspectos mais presentes nos álbuns do Wolfheart, liricamente falando, é essa aproximação dos velhos contos finlandeses. Vocês são uma das bandas que mais se aproximam da velha mitologia finlandesa, algo que também sempre apreciei no Amorphis.

Tuomas: Sim, a verdade é que sempre gostei muito desses contos, acho que eles falam muito sobre a personalidade do finlandês naqueles tempos e nos tempos atuais também. Quer dizer, são mitos, mas eles mostram a maneira como o pensamento das pessoas funciona, e isso acaba abrindo muitas possibilidades para uma história, você tem muito material sobre o qual trabalhar. Bem, temos aqui na Finlândia um livro que compila todas essas histórias mitológicas, o Kalevala. O Kalevala é uma espécie compilação de contos, o autor basicamente viajou de vilarejo para vilarejo documentando diferentes histórias e crenças que foram passadas adiante de forma oral ao longo dos tempos através dos antigos pagãos de cada vilarejo. São histórias muito tradicionais, contadas oralmente de uma geração para outra, mas há dezenas de histórias de cada região que não entraram no livro. É um livro muito abrangente, de grande valor histórico e muito valorizado como documento. Os caras do Amorphis basicamente se tornaram os ‘embaixadores mundiais’ desse livro, são os grandes divulgadores dele para todo o mundo, pois suas músicas são todas baseadas nesse livro. O segundo álbum deles, Tales From A Thousand Lakes (1994), todas as letras são traduções de textos do Kalevala, e até a capa tem muito a ver, pois aquele símbolo belíssimo que você vê na capa, e que também aparece em outras capas deles, é o equivalente finlandês ao Martelo de Thor, talvez o símbolo mais conhecido de toda a mitologia nórdica. Até eu sou fã do Amorphis por tudo o que eles fizeram musicalmente e liricamente, então eles foram uma grande referência, e por isso mesmo eu tinha que tomar cuidado para não copiar o que eles já tinham feito. Basicamente, ao longo dos anos fui me concentrando naqueles outros contos tradicionais finlandeses que não entraram no Kalevala, naquelas histórias paralelas, por assim dizer. Existem muitas delas, e sinto que poderíamos passar décadas trabalhando nisso sem precisar repetir uma história.

Ou seja, não será fácil vermos um álbum do Wolfheart cheio de pontas soltas e temas desconectados em cada faixa.

Tuomas: Sim, é certo que isso não acontecerá, ao menos não tenho nenhuma vontade de fazer algo assim no momento. Eu gosto de cair de cabeça em cada álbum que fazemos, e o melhor para isso é mergulhar completamente em um conceito, gosto da sensação de estar cercado de elementos que levam para um mesmo caminho, ou de caminhos que levam para um mesmo fim. Isso não significa dizer que sempre falarei de mitologia, mas sim que pretendo estar sempre trabalhando em álbuns conceituais.

E é bem legal perceber que você mistura canções de todos esses álbuns com diferentes conceitos ao vivo, e continua tendo uma unidade musical coesa e poderosa.

Tuomas: Sim, obrigado por perceber. Aí acho que entra muito o papel da música. Sempre tivemos essa sonoridade bastante pesada e poderosa, mas também com muitas partes mais atmosféricas e melódicas, que são recursos importantes na hora de mesclar letras e música. Bem, eu não tinha ideia disso no começo, sendo bem sincero com você, mas acontece que esses mesmos elementos atmosféricos e melódicos criam uma espécie de conexão musical que funciona muito bem ao vivo, de forma que as pessoas não se sintam deslocadas. Claro que eu nem tinha ideia disso quando fiz o primeiro álbum do Wolfheart dez anos atrás (risos gerais).

Em 2020 você mergulhou na História finlandesa em Wolves Of Karelia, abrindo uma nova possibilidade para os álbuns conceituais do Wolfheart. Houve uma razão especial para isso?

Tuomas: Sim, acho que eu quis conectar os mundos, sabe? Quer dizer, todo mito teve um papel na História de um povo, então sempre estive vagando em torno da tradição e do passado do nosso país, mas naqueles dias aconteceu algo diferente. A verdade é que o Wolfheart cresceu bastante nos últimos anos, e passamos meses longe de casa, tocando pela Europa, América do Sul, América do Norte, enfim, em todos os lugares. A saudade de casa vai batendo, e você começa a lembrar de tudo o que estudou na escola, das coisas que vê na TV, e o grande evento histórico da Finlândia é a Guerra de Inverno! Foi como um clique, eu simplesmente senti que tinha que contar aquela história para as pessoas, é provavelmente o evento mais importante de toda a nossa História, várias pequenas batalhas envolveram tantas pessoas e marcaram tão profundamente o nosso povo por gerações, mas a maior parte das pessoas ao redor do mundo sequer sabe que essa guerra aconteceu, pois os seus livros didáticos não trazer sequer uma menção a ele. Era hora de dar esse mergulho no passado e contar a história de alguns dos nossos heróis, e gostei muito de fazer aquilo, mas preferi focar em algo diferente nesse mais novo álbum, King Of The North (2022), pois não quero soar como um professor (risos gerais).

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