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CIRITH UNGOL: A DESPEDIDA

"Queremos sair em grande estilo em vez de virarmos uma paródia de nós mesmos" - Robert Garven

Foto: Peter Beste

Por Daniel Agapito

Após nove anos de seu retorno, os americanos do Cirith Ungol anunciaram que vão se aposentar dos palcos em 2024. Antes disso, porém, lançaram seu 6º trabalho de estúdio, “Dark Parade”, através da Metal Blade Records. Ao longo de seus anos de atividade, a banda veio ganhado certo status cult, sendo considerada uma das referências do doom e do epic metal. Falamos com o baterista e fundador Robert Garven sobre o novo álbum e a história por trás da banda.

Vocês acreditavam que ver o retorno da banda era desejo de poucos, mas qual o saldo da repercussão da volta até então?
Robert Garven:
Somos apenas uma banda da Califórnia tocando heavy metal e escrevemos a maioria das músicas para nós mesmos. Então, o fato de que pessoas também gostam da banda é o que realmente faz valer a pena. Eu acho que quando voltamos estávamos na expectativa de fazer apenas um ou outro show, e o fato de que lançamos alguns álbuns, um EP, e um álbum ao vivo, já excedemos nossas expectativas. É por isso que ano que vem vai ser nosso último ano tocando ao vivo, pois queremos sair em grande estilo em vez de virarmos uma paródia de nós mesmos. Não queremos estar no palco aos 80, com andadores (risos).

Vocês mesmos falaram em entrevista que a banda tem dois lados, o lado espada e feitiço e o doom. Como “Dark Parade” consegue reunir elementos de ambos lados para fechar a discografia?
Robert:
Pelo menos com os últimos três álbuns – “Paradise Lost”, “Forever Black” e “Dark Parade” –, o lado B é dedicado exclusivamente à parte mais doom de nossas músicas e há o que alguns diriam que é a visão escurecida e da queda da humanidade vinda de Tim, nosso vocalista. O lado A é, e sempre foi, um lugar em que outras músicas com outros temas possam residir. A ideia da “Sacrifice”, de “Dark Parade”, foi compor uma música sobre sacrifício humano, talvez asteca ou maia. A maioria dos títulos é obscuro, desde o começo. O lado B tem o material doom, e ambas estas personalidades têm existido ao decorrer dos anos, mas como o mundo está descendo esta espiral do caos acho que estamos compondo mais músicas sinistras e atreladas ao doom.

Por sinal, “Dark Parade” fala bastante sobre o pessimismo e a dor. Como esses temas foram incorporados? Eles sempre estiveram presentes em suas composições ou foram aparecendo com o tempo?
Robert:
Eu acho que tocar a música mais doom nos dá uma saída para nossos sentimentos e para o que está acontecendo ao nosso redor. Todos nós queremos pensar que somos otimistas, e ver o mundo sobreviver com todos felizes, mas se olharmos para o que está acontecendo, é difícil ver isto se manifestar ao nosso redor. “Dark Parade” é como uma continuação do que fizemos no “Forever Black”, que foi explorar quão ‘doloroso’ e disruptivo o homem tem sido ao planeta, à nossa própria civilização. E é algo óbvio, você liga o noticiário e aparecem notícias de guerra, colapso climático, morte, destruição; é horrível. Gostaria de pensar na criação destas músicas como se você estivesse indo ver um filme de terror. Eu e você não estamos necessariamente sendo afetados pelo que está acontecendo hoje em dia, mas em um filme de terror geralmente são acontecimentos ficcionais e fantásticos, mas em nossas músicas falamos de coisas que estão realmente acontecendo, mas não necessariamente nos afetam. Se isso faz sentido.

Quando “Paradise Lost” foi lançado em 1991, marcou uma mudança significativa no som da banda. O que os levou a explorar novas direções musicais naquela época?
Robert:
Tínhamos trabalhado com um produtor diferente, pessoas diferentes na banda, perdemos um pessoal e achamos outro, perdemos mais alguns durante a gravação (risos). Houve algumas mudanças. Eu não acho que as partes centrais são tão diferentes de “One Foot in Hell” (1986). Também por conta do nosso produtor, Ron Goudie, um cara muito legal que, aliás, morreu recentemente, eu não concordei muito com a forma que gravamos aquele álbum. Ele pegou cada membro da banda e gravamos nossas partes separadamente. Eu toquei minha bateria sem ouvir nada, só um clicktrack. Cada integrante era trazido para tocar suas partes e ninguém podia ouvir nada até acabarmos. Em nossos trabalhos antigos, especialmente os primeiros dois, em que tínhamos controle criativo total, foi um choque para banda ter feito algo assim. É como se você fosse um pintor, e fosse pago para pintar um quadro, mas queriam que usasse uma venda, e só poderia ver o quadro depois de acabado. Eu fiquei muito bravo, falei coisas horríveis sobre o Ron. Fizemos as pazes antes de ele passar daqui para melhor, e fico feliz que pude enterrar esta briga e tudo mais.

Foto: Peter Beste

Isto chegou a impactar negativamente a banda?
Robert:
Foi doloroso e um dos fatores que fez a banda acabar. Isso e outras trocas de formação, alguns problemas com integrantes. No final, só sobrou eu e Tim (Baker, vocalista) sentados em uma sala de ensaio pensando ‘por que estamos aqui? Por que estamos fazendo isso?’ Na época havia o hair metal acontecendo, boa parte do thrash, e nós achávamos, e ainda achamos até hoje, que o heavy metal que tocávamos era o metal com que crescemos. Pode chamar de true metal, classic metal, o que quiser, mas é a música que amamos. Vimos na hora que não havia mais caminho a seguir e fomos aí que guardamos nossas coisas e fomos embora. Quando voltamos em 2016, fomos convencidos pelas pessoas que havia uma galera que queria nos ver tocando, e não sabíamos ao certo se era verdade. Porém, como você falou, tocamos alguns shows muito bons e somos uma banda cult e isso nos deixa orgulhosos. Agora sabemos que existem alguns ouvintes procurando algo diferente. Uma banda como a nossa, cult, não visa aquela adoração em massa, estamos procurando um grupo menor de pessoas que procuram algo diferente e que amam o que estamos tentando fazer.

O nome da banda, em Sindarin, uma das línguas élficas criadas por J.R.R. Tolkien, pode ser traduzido aproximadamente como “A Passagem da Aranha”. Como vê a influência da obra de Tolkien no rock/heavy metal desde os tempos do Led Zeppelin até o Blind Guardian, passando pelo Cirith Ungol?
Robert:
Essa é a história de como se juntamos! Eu e Greg (Lindstrom, guitarra/teclado) estávamos na aula de inglês, tínhamos um 13 anos de idade e era para lermos o Senhor dos Anéis, do J.R.R. Tolkien. Tem que considerar isso, por que é loucura; tínhamos 13 anos de idade, e uma professora nos deu um livro de 700 páginas e nos disse “vocês têm que ler isso, e tem mais dois livros depois”. Foi bastante na época. Isso foi antes dos filmes, nenhum de nós conhecíamos (os livros). Tolkien influenciou bastante a banda, e você está certo, eu acho que influenciou um monte de gente também. É um trabalho extenso e magnífico. Alguns falam mal dos filmes por ser uma versão condensada dos livros, mas ao meu ver o Peter Jackson fez um trabalho muito bom com O Hobbit e O Senhor Dos Anéis, pelo menos sem ter destruído a história central; muitos fazem isso com adaptações para cinema. É engraçado que sempre pronunciamos nosso nome como “Sirith Ungol”, e já foi dito para nós que no livro é pronunciado “Quirith Ungol”. Chegamos a ler os livros umas duas ou três vezes, mas nunca até o apêndice, onde diz a pronuncia dos nomes. Estávamos tocando na Alemanha, no RockHard festival, e uma jornalista chega para nós e nos pergunta: “é verdade que sabem falar em élfico?” e eu respondo “não, longe disso, se fosse verdade pronunciaríamos nosso nome do jeito certo.” Essa é uma pequena piada que temos.

A capa de “King of the Dead” é uma das mais emblemáticas do heavy metal. Poderia compartilhar a história por trás dessa imagem e como ela se relaciona com o álbum?
Robert:
Sabe, quando nos juntamos, estávamos sempre à procura de um contrato de gravação. Mandamos demos em fita K7 para várias gravadoras, mas nunca recebemos nenhum retorno. Foi por isso que decidimos lançar “Frost and Fire” (1981), para tentar conseguir apoio de alguma gravadora. Pusemos nosso material mais acessível, o que na época era chamado de material top 40, para ser tocado na rádio naquele LP, o que as gravadoras poderiam considerar como mais acessível ao público geral. Quando ninguém, pelo menos nenhuma gravadora se impressionou e nos disseram “nossa, é muito esquisito, é muito pesado, é muito estranho”, ficamos tipo: “mas esse é nosso material acessível…” Decidimos que em nosso próximo álbum, “King of the Dead”, não iríamos nos segurar. Algumas das músicas de lá coexistiam com algumas de “Frost and Fire”, então não era como se fossem 100% novas, mas foi isso que decidimos fazer. Queríamos lançar o disco mais pesado possível. Foi tudo autofinanciado, pois pedi dinheiro emprestado para os meus pais para gravar, e depois consegui acabar pagando de volta. Já éramos amigos de Michael Whelan (artista), que nos deixou usar a pintura dele, chamada de “King Of the Dead” também, que inspirou o nome para a música e o título do LP. É uma pintura incrível. Eu nunca a vi pessoalmente, mas consegui ver a “Stormbringer” (capa do “Frost and Fire”) e tenho que lhe dizer: se tiver a chance de ver algumas de suas pinturas na vida real, vá ver, porque são além do inexplicável. Parece que estão brilhando. Quando você olha para ela, parece que está brilhando por detrás do quadro! Nenhuma capa de álbum ou de livro pode realmente mostrar como são de verdade. Michael tem sido um grande amigo da banda. Usamos quase todas de suas pinturas do “Elric” até agora, tem mais uma e esperamos conseguir usá-la para um projeto futuro.

A cena do heavy metal mudou significativamente desde os primeiros dias da banda. Como vocês veem o estado atual do gênero e qual é o papel do Cirith Ungol nesse cenário?
Robert:
Alguém disse isso e eu acho que pode ser verdade, se tivéssemos se juntado 5 anos antes ou depois de quando nos juntamos, em meados de 2015, 2016, nossa reunião talvez não teria funcionado do jeito que funcionou. A sociedade muda, a cultura muda, o gosto das pessoas muda… Acho que a comunidade verdadeira do heavy metal sempre vai gostar de heavy metal; não quero dizer que estão indo embora. Há tantas coisas culturais nos “puxando”, filmes, novas músicas, bandas novas, coisas estranhas como guerra na Europa e tudo mais. Com tantas coisas acontecendo ao nosso redor, eu acho que a hora que nos juntamos foi a hora certa. Acho que, mais uma vez, nós nos despedindo, pelo menos dos shows ao vivo, pode ser uma coisa boas, porque parece que saturamos algumas áreas. Sei que vai dizer que queria que tocássemos mais aí no Brasil, mas grande maioria de nossos shows tem sido na Europa e acho que tocamos em muitos festivais parecidos. Pode se dizer que alguns dos frequentadores destes festivais estejam não necessariamente cansados do Cirith Ungol, mas iriam preferir ver algumas bandas diferentes, sabe?

Seguindo na sua linha de raciocínio, em entrevista conosco, vocês disseram que a pausa serviu para mudar opinião pública, mas internamente, como que a banda foi afetada?
Robert:
Fomos afetados com certeza. Uma maneira de evidenciar isso é que muitas bandas que estiveram juntas durante todo nosso período de hiato, alguns dos álbuns que eles lançam não tem a mesma energia. O fato de termos tido este hiato de 25 anos foi como tirar um cochilo. Sabe quando acaba de almoçar e tira um cochilo e agora tem mais energia para voltar a trabalhar? Acho que foi isso que aconteceu conosco. Além disso, também defendo que existem alguns mal-entendidos em relação às nossas músicas. A meu ver, quando as pessoas reveem nossas músicas veem que foram populares na época, que vários gostaram, mas não as massas que precisamos para termos sucesso financeiro e musical. Com o tempo, as pessoas puderam olhar para trás de um ponto de vista diferente, e é o que estou dizendo agora com nosso material novo. Falam tipo “ah, seu novo álbum é bom, “Forever Black e “Dark Parade” são bons”, mas eu realmente acredito que, em 5 ou 10 anos, as pessoas vão ver estes (discos) da mesma maneira que agora veem “Frost and Fire” e “King of the Dead”. Não sei se vão dizer que são álbuns revolucionários, mas tenho certeza que vão dizer que são trabalhos fortes. “Por que não foi mais popular? Por que não foi considerado o melhor álbum do ano?” Esta é a maldição da banda, estamos sempre tocando música à frente do nosso tempo ou fora de sintonia com nosso tempo.

A abordagem única, combinando elementos de fantasia e letras épicas de “Frost and Fire” (1981) fez da banda uma referência do epic metal. No entanto, o Cirith Ungol é visto como uma banda cult. Como descreveria o impacto da banda no metal e como gostaria de ser lembrado no futuro?
Robert:
Uau, esta é uma pergunta difícil! Muitas bandas disseram que foram influenciadas por nós, fomos chamados de ‘pais do doom metal’, não sei se tudo isso é verdade, mas se for é uma honra e é muito gratificante ouvir as pessoas dizerem isso, mas não sei se é realmente verdade. Eu sei que bandas que me influenciaram quando era menor me ajudaram no caminho da descoberta das músicas que eu gostaria de tocar, ou partes de bateria que queria compor. Não estou descontando isso. Só estou dizendo que queríamos ter tido um impacto maior na cena da música que do que realmente tivemos. Em relação a como queremos ser lembrados, espero que as pessoas lembrem de nós do mesmo jeito que lembro das bandas que me influenciaram. Bandas como Sir Lord Baltimore, Budgie, Dust ou algumas das mais obscuras que só lançaram um álbum ou outro. Eu espero que sejamos lembrados como uma banda que nunca se vendeu e sempre permaneceu fiel a si mesmo e visou criar a música mais pesada possível que conseguia. Agora se tivemos sucesso eu já não sei, mas nunca paramos de tentar. Mesmo com a banda parando de tocar ao vivo, vou tentar continuar a trabalhar e criar material novo.

Foto: Peter Beste

A banda vai se aposentar em 2024. Se pudesse recomeçar, o que faria de diferente?
Robert:
Ai…, não sei. Seria mais novo (risos). É a única coisa que posso dizer. Não acho que fizemos nada de errado. Acho que tudo que aconteceu foi perfeito. Novamente, foi uma “fatia do tempo”, quando nos aposentarmos as pessoas vão ficar tristes, vão dizer que queriam por que queriam ter nos visto. Sabe, a vida é sobre isso, há um pequeno momento em sua vida onde você é jovem, está feliz, está saudável e tudo está indo suavemente. Quando as pessoas envelhecem elas adoecem e amigos e família passam dessa para melhor; a vida muda. Eu acho que o fato de conseguirmos voltar, no final do ano que vem vai fazer 9 anos, é insano, porque só estivemos juntos por 20 anos da primeira vez. O fato de que conseguimos esticar nosso “15 minutos de fama” para 9 anos é muito incrível. Só espero que o dia que tocarmos novamente no Brasil, especialmente em São Paulo que posso te ver e que você possa vir e nos dar oi e dizer: ‘lembra que fizemos aquela entrevista para a Roadie Crew?’ (risos).

Alguma consideração final?
Robert:
Obrigado por ter cedido seu tempo para falar sobre a banda, e eu espero vê-los em um de nossos últimos shows ano que vem. Vocês não ficarão despontados; podem ficar enojados, mas não despontados (risos).

Instagram: https://www.instagram.com/cirithungolband/
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