Por Leandro Nogueira Coppi
Sete anos após a estreia com No Fear to Face What’s Buried Inside You, o AttracthA lançou um novo petardo no final de 2023. Conceitual, Lex Talionis surge em um novo formato, acompanhado de uma belíssima HQ com uma história de violência urbana e terror escrita pelo baterista Humberto Zambrin. Sonoramente, o AttracthA soa ainda mais vigoroso em seu heavy metal com influências de thrash e de hard rock, com pontes e refrãos que grudam na mente. Havia muito a ser falado sobre Lex Talionis, a primeira parte você encontra na nova edição da ROADIE CREW, #279 (para adquiri-la, clique aqui). A seguir, você confere a continuação da entrevista com o experiente baterista.
Após o bem recebido debut No Fear to Face What’s Buried Inside You (2016), vocês participaram de tributos a AC/DC e Black Sabbath, e no Helloween de 2022 lançaram o single The Chase. Entretanto, o novo álbum Lex Talionis demandou dois anos e meio de trabalho. O que houve?
Humberto Zambrin: Em primeiro plano, a demora foi pelo fato da ‘tour’ do No Fear… ter se estendido até novembro de 2019. Não que ela tenha sido consistente e exaustiva assim, sejamos sinceros (risos), mas fomos recebendo convites de festivais em quase todo território Nacional e acabamos nos empolgando. Em janeiro de 2020 nos reunimos para planejar o novo álbum, algumas músicas até foram feitas, mas com a pandemia tudo complicou. Retomamos o projeto em novembro de 20 e as gravações começaram em janeiro de 21. Outros problemas pela pandemia também tornaram o processo mais lento do que o imaginado.
Ao invés de lançar Lex Talionis fisicamente de modo convencional, vocês inovaram lançando-o como uma Graphic Novel. Esse tipo de experiência não deixa de ser atratativa. Se antes ouvíamos discos lendo o encarte, ao menos o fã do AttracthA tem a oportunidade hoje de emergir no universo de Lex Talionis através da HQ que ambientaliza o conceito. Especialmente nos anos 80, esse seria o combo perfeito para um headbanger: metal, terror e histórias em quadrinhos, artes que andavam de mãos dadas. A que se deve essa ideia inovadora e ao mesmo tempo com esses ingredientes que sempre se conectaram?
Humberto: Eu não consigo me lembrar de onde ou quando a ideia surgiu. Talvez tenha sido durante a divulgação do No Fear…, pois eu percebia nitidamente que as pessoas não compreendiam as letras das músicas. Outro fator que me recordo é que no início da pandemia fizemos uma live com os fãs para conversar e etc. Lá nos perguntaram se o novo álbum seria conceitual. Como eu sempre fico a cargo das letras, respondi que não sabia, que ainda era cedo, e as pessoas que estavam na live começaram a pedir por um álbum conceitual. Acho que isso pode ter me dado, inconscientemente, a ideia de fazer uma revista em quadrinhos, porque automaticamente pensei: ‘se as pessoas não entendem as letras, a melhor forma de contar uma história é um filme, ou um desenho animado, ou uma revista em quadrinhos’. Me recordo bem que alguns meses antes de iniciarmos o processo de composição do Lex Talionis, tive a certeza de que ele seria, em parte, uma Graphic Novel. A ideia original era que a revista viesse em forma de encarte de uma edição em vinil e que houvesse a versão em CD sem a revista. Começamos a produção da história e a HQ foi tomando corpo ao mesmo tempo em que esbarrávamos em problemas técnicos, financeiros e comportamentais em relação ao formato. Quase não encontrei mais fábricas de CD com valores viáveis. Com os vinis tínhamos o problema da duração das músicas, fazendo com que a única alternativa fosse um álbum duplo, de custo altíssimo. Daí fomos para o comportamental: fizemos uma enquete em nosso Instagram para ver qual porcentagem de pessoas ainda ouvia CDs, qual seria consumidor de vinil e qual percentual tinha o hábito da leitura. Daí tiramos: 40% apenas das pessoas têm onde ouvir ou ouvem CDs; 39% somente tinham acesso a ouvir e comprar vinis; 88% ouviam música por streaming na maioria do tempo; e 70% tinham o hábito de ler. Com isso pareceu óbvio lançar apenas a HQ, com o QR Code para o álbum na plataforma de maior Market Share no Brasil. Eu não digo que dispensamos lançar Lex Talionis fisicamente, mas sim que o formato fisico do álbum é a revista, um novo formato!
Tem razão. Bem pensado!
Humberto: Agora, quanto a ter essa combinação de música, terror e quadrinhos, acho que é uma coisa meio natural para mim, porque são as formas de entretenimento mais próximas a mim durante minha vida. Eu aprendi a ler aos cinco anos com revistas do Batman e do Superman, comecei a tocar aos nove, sempre apaixonado por música, e filmes são meu hobby desde meus cinco anos também, quando fui ao cinema pela primeira vez! Acho natural e é muito comum encontrar esses componentes no entretenimento da galera da minha geração.
O conceito do disco, estendido para a HQ, veio de algum tipo de leitura ou de autor, foi influenciado pela violência do Brasil de que comentamos na primeira parte dessa entrevista (publicada na nova edição da ROADIE CREW) ou inspirado por alguma outra fonte?
Humberto: Tenho muito contato com pessoas no meu trabalho na música, todos os dias conversando e trocando experiências. Sempre surgem as histórias de violência, assalto, sequestro, e quando você coloca mais de duas pessoas num mesmo local… Mas essa não foi a principal fonte. O centro nervoso da história de Lex Talionis está no universo do terror mesmo, que é um gênero que eu consumo – nem tanto na literatura, mas bastante no cinema. Mas sendo Lex Talionis uma história também de origem, o “começo” de tudo tinha que ter sua relevância, então naturalmente usei essa bagagem de violência urbana presente no meu dia a dia para criar o arco inicial e ambientar isso na nossa realidade.
Apesar do clima urbano e de terror da H.Q. de Lex Talionis, a trama envolvendo o personagem Carlos se mistura com a realidade violenta do Brasil. O que acontece a ele nos episódios transcritos das músicas The Past is Gone e No, dá até um sentimento de revolta. O que o inspirou a escrever a ficção?
Humberto: Acompanhe a pergunta e a resposta na ed. #279 da ROADIE CREW.
Na produção vocês trabalharam com o premiado Adriano Daga; já no debut, No Fear to Face What’s Buried Inside You, tiveram Edu Falaschi. O que os levou a mudar de produtor?
Humberto: Acompanhe a pergunta e a resposta na ed. #279 da ROADIE CREW.
O desenvolvimento gráfico e ilustrativo da HQ ficou nas mãos de profissionais gabaritados. Que tipo de referências foram debatidas entre vocês para a elaboração do projeto e qual foi o sentimento quanto ao resultado?
Humberto: As referências que busquei foram em quadrinhos mais soturnos e sombrios de heróis, que é algo que eu consumi minha vida toda. Mas nem tudo são flores na nossa vida… A criação dessa HQ tem história! Comecei o projeto em parceria com a Editora Universo Fantástico e a equipe de criação era 100% outra. Desde o inicio eu sabia o que queria como produto final, do tipo de traço do desenho às cores; tudo estava bem claro na minha cabeça. Consumo quadrinhos há mais de 40 anos, aprendi a ler, lendo quadrinhos. Então, desde o momento zero, me dispus a fazer tantas reuniões fossem necessárias para que a revista saísse da forma que deveria. Quando chegamos na metade da revista, já tínhamos trocado de colorista duas vezes e não teve jeito, tivemos que demitir o desenhista e recomeçar tudo do zero. Simplesmente entramos numa rota de conflito criativo que não andava. Desde o começo eu separei muitas publicações (além de consumir quadrinhos, sou colecionador) e dei todo direcionamento necessário de estilo de traços, cores, diagramação, tudo. Quando a coisa estava totalmente fora do eixo recomeçamos e a editora, na figura do Roberto, que é quem estava à frente, foi totalmente comprometida com minha idealização. A partir daí, tivemos o Guilherme nas cores, que já entendeu de cara o tom que deveríamos ter, e o Roberto surgiu com o nome do Mozart Couto, que é um monstro consagrado do desenho no segmento terror. Quando as primeiras páginas, refeitas pelo Mozart, chegaram, minha expectativa foi superada em 200%. Estava além do que eu pude sonhar, pensando em investimento e, graças a um trabalho sensacional de equipe, chegamos em algo que é uma Graphic Novel que eu tenho orgulho de ostentá-la!
A história fica bem triste no capítulo que segue a balada Tomorrow is Too Late, música de cunho emocional para você e Ricardo Oliveira (guitarrista), que há alguns anos perderam mãe e irmão, respectivamente. Como foi traçar um paralelo entre suas perdas homenageadas na música e esse capítulo?
Humberto: Foi fácil. Precisávamos de um trauma na história para fazer a virada de violência urbana para terror, então a oportunidade já estava lá. Mas por trás disso tem muita coisa. Minha mãe faleceu em 14 de dezembro de 2017, faltando dez dias para o Natal, data do ano que ela mais amava. Entrei num estágio de depressão significativo na época e muitas das frases da letra de Tomorrow is Too Late foram escritas no início de 2018 como parte do meu esforço de colocar para fora uma certa culpa por achar que não tinha feito tudo que era necessário pela minha mãe – aliás, o título Tomorrow is Too Late vem da última frase que ela me falou. Ela necessitava usar um medicamento específico e não conseguia, estava abatida, cansada, na UTI do hospital. No seu último dia de vida insisti muito para que ela tentasse. Ela tentou e, por fim, me disse: “Não consigo mais hoje, preciso descansar. Amanhã eu vou conseguir, prometo. Hoje não consigo mais tentar”. Tudo isso estava na minha cabeça e escrevi alguns versos, o refrão e tive a ideia de uma melodia. Isso ficou guardado e era certo para mim que o próximo álbum teria uma balada para homenageá-la e, de certa forma, externar minha frustração. Infelizmente, quando iniciamos, em 2020, recebemos do Ricardo a notícia de que o irmão dele estava mal e em tratamento. Em 2016, eu já havia escrito a música Victorious, do No Fear…, para a irmã do Ricardo, Lilia, que lutava contra um câncer, e também para homenagear o Cleber (Krishikak, vocalista), que teve algumas lutas contra essa doença na família dele – inclusive, a mãe dele faleceu por isso. Então, esse suporte mútuo através da música sempre esteve conosco. Infelizmente, em fevereiro de 2020 perdemos o Paulinho, então a homenagem se tornava mais do que necessária. Somamos a isso a energia do Cleber em abraçar com tanto amor a ideia pensando na própria mãe, que o resultado é uma explosão sentimental absurda. Foram “n” sessões de composição, gravação, mixagem, onde chorei, choramos e acho que ainda choraremos com essa música. Tem muita coisa ali. Muita, mesmo! Inclusive, a melodia de voz foi terminada numa videochamada entre mim e o (vocalista) Alirio Netto (ex-Shaman), que estava em Madrid, os dois chorando de emoção. Obrigado Alirio, Cleber e Ricardo! Em minha humilde visão, é uma obra prima.
Na Tomorrow is Too Late e em Today vocês contaram com o reforço do ex-Shaman Alirio Netto. Em I See You, Björn “Speed” Strid (Soilwork/The Night Flight Orchestra) fez um duo agressivo com Cleber Krichinak. Explique tais convidados.
Humberto: Acompanhe a pergunta e a resposta na ed. #279 da ROADIE CREW.
O The Night Flight Orchestra estreará no Brasil na próxima edição do Summer Breeze. Existe a possibilidade de um encontro entre vocês e Björn para alguma ação relacionada a Lex Talionis?
Humberto: Acompanhe a pergunta e a resposta na ed. #279 da ROADIE CREW.
Abrir mão de lançar Lex Talionis em CD/LP é uma ideia estritamente pensada para este álbum ou essa estratégia será uma tendência para os futuros lançamentos do AttracthA? Até porque, quanto a história contada no disco, não só você antecipou na primeira parte desta entrevista que ela não termina nele, como o próprio final da história contada na HQ deixa isso no ar…
Humberto: Definitivamente, fora uma nova possibilidade de continuar a obra só com a revista, sem necessariamente ter mais um álbum ligado a isso, eu acredito que o único formato físico que eu gostaria e me empenharia para lançar seria em vinil. Fizemos uma edição limitada do No Fear… em 2022 para celebrar os seis anos do álbum. Se a banda crescer e tivermos um bom potencial de vendas para um formato físico, eu faria isso em vinil, pois os números fora do Brasil mostram um crescimento absurdo disso. Tanto que o Metallica comprou a maior fábrica de discos de vinil dos Estados Unidos… (N.R.: leia a respeito aqui)
Você mencionou a preocupação com os refrões, e os do AtracthA, assim como os ‘bridges’, são bem instigantes. Os de muitas músicas de vocês grudam na mente: No More Lies, Payback Time, as novas The Past is Gone e Today – só para citar alguns exemplos.
Humberto: Acompanhe a pergunta e a resposta na ed. #279 da ROADIE CREW.
Vocês têm investido em Lex Talionis, acreditado na força do álbum: o lançaram em formato HQ, gravaram clipes bem bacanas e criativos para I See You (com participação de Björn Strid) e The Past is Gone e um muito bonito para Tomorrow is Too Late. Acredito que os planos agora para 2024 estejam voltados aos shows de divulgação. Apesar disso, há alguma outra estratégia nos planos de divulgação do disco?
Humberto: Exato! Esse ano é um ano de shows para divulgação desse trabalho e também de matar a sede de palco, porque a última vez que tocamos foi em novembro de 2019! Já estamos em jejum tempo demais! (risos). Fora as divulgações tradicionais mesmo, como entrevistas em vários sites, podcasts e etc, devemos embarcar numa mini-tour de feiras e eventos de quadrinhos, para levar a música a outro público também. O lado bom de se ter uma obra como o Lex Talionis é que realmente podemos navegar em outros mares e tentarmos levar a música além das fronteiras da cena do metal. Quem sabe com isso tragamos mais pessoas para o nosso meio, que, aliás, carece de gente nova! (risos)
ATTRACTHA AO VIVO
Ao lado da banda About2Crash, o Attractha irá se apresentar no dia 19 de abril no La Iglesia Borraxteria, em São Paulo. No repertório, o grupo focará no álbum Lex Talionis. Nas palavras de Humberto Zambrin, “Está chegando a hora de lançarmos o Lex Talionis da forma certa: com um belo show, recheado de músicas novas!”. Saiba mais sobre o evento clicando aqui.