Com lançamento previsto para o próximo dia 21 de setembro deste ano, o primeiro álbum do Deep Memories já obtém muitos elogios em diversas partes do mundo. De fato, a música feita é surpreendente, um Doom Metal permeado por diversas influências e muito profundo, com certeza será um marco para o estilo.
Para falarmos à respeito deste álbum que vai com certeza mudar os rumos do Doom Metal convidamos o seu mentor e multi-instrumentista Douglas Martins, para nos falar à respeito deste trabalho fantástico e também de como surgiu essa banda “one man band”. Neste trabalho o Douglas prova que é possível sim, fazer um trabalho memorável mesmo sozinho.
Você foi membro de umas das bandas mais importantes do país, o Desdominus, até 2005. Com eles você gravou as primeiras demos e no Debut você também assumiu os vocais. Com tantos anos dedicados aos Desdominus e tendo um papel tão importante em sua história, como surgiu a decisão de deixar a banda?
Douglas Martins – Primeiramente, obrigado pelo espaço cedido Éden & Roadie Crew!
Certamente não foi uma decisão simples de se tomar. Depois destes 13 anos longe da banda, olhar para trás e analisar como estava minha vida e minha mente naquele período, posso te afirmar com toda certeza que 2004 e 2005 foram os anos mais negros e conturbados da minha vida. Vários excessos, problemas pessoais e tantos outros fatores tinham me tirado fora do eixo. Não tinha como eu continuar. A Desdominus sempre havia sido prioridade na minha vida durante anos e isso havia se perdido… Eu precisava reorganizar as coisas.
Neste período de 2005 até 2016 ano em que ficamos sabendo do Deep Memories, você participou de mais alguma banda?
Douglas Martins – Não, não participei de nenhuma banda.
Confesso que fiquei muito surpreso, pois quando ouvi o belíssimo Deep Memories exibindo seu talento e versatilidade foi como já disse, uma surpresa. O Deep Memories já existia como projeto quando você ainda pertencia ao Desdominus?
Douglas Martins – O Deep Memories veio bem depois de eu sair. Você que também é compositor sabe que as vezes surgem ideias que não se enquadram na sonoridade da banda que está envolvido, mas apenas um riff daquela época (que não tinha se enquadrado naquela sonoridade) está no Deep Memories – o riff principal da música “Explicit Way To Relieve Pain” que é bem lento e arrastado. Os demais sons surgiram ao longo dos anos pós 2005. Eu nunca parei de tocar, somente não estava em uma banda.
Há pretensão do Deep Memories se tornar uma banda com mais alguns membros para apresentações ao vivo?
Douglas Martins – Muitos tem me perguntado sobre isso. Não cara, não penso em tocar ao vivo. Estou realmente satisfeito em manter o Deep Memories como algo somente de estúdio. Quando se está em uma banda, existe uma química, a espécie de uma magia que rola quando os integrantes executam o que foi composto por todos. Isto pode até ocorrer com o tempo, mas acredito que algo da essência do projeto poderia se perder.
Acredito que todos assim como eu ao ouvir o EP “In Too The Deep…” ficaram maravilhados com o Doom Metal apresentado. Como foi a reação do público referente a este material?
Douglas Martins – Sendo bem sincero contigo, me surpreendeu bastante. Sabia que o material havia ficado legal, mas o retorno foi estrondoso. Vários compartilhamentos e diversas mensagens do Brasil inteiro querendo adquirir o material. A ideia do EP surgiu em uma conversa com o Wilton da Heavy Metal Rock e logo em seguida envolvemos o Marco Amaral da Misanthropic Records. Sabíamos que tínhamos um bom álbum na mão, mas ninguém conhecia o nome Deep Memories e então o material promocional fez todo o sentido, pegamos duas músicas do álbum e fizemos 1000 cópias este EP que foi distribuído gratuitamente entre selos, zines, distros e lojas da galeria do rock que, entregavam em mãos ou enviavam de brinde junto com seus materiais. Eu também enviei diversos apenas pelo custo do frete. Isto nos deu uma boa visibilidade e também uma dimensão do que o projeto poderia vir a se tornar.
Por falar em Doom Metal, como surgiu a ideia de tocar este estilo?
Douglas Martins – Acabou surgindo naturalmente. O Doom Metal junto com o Heavy Metal sempre foram meus estilos preferidos, ouço quase todo dia até hoje. Quando conheci o metal, a primeira banda que fiquei fissurado foi o Black Sabbath então a veia mais Doom já veio daí. Mas se observar com calma verá que a sonoridade do Deep Memories vai além do Doom Metal. Quando comecei as gravações não tinha noção de como o som ficaria no final. Boa parte dos sons já estavam concluídos e ainda não tinha decidido se teria ou não vocal! Acredito que as estruturas das músicas derivam do antigo Death Metal Sueco, com grandes influencias do Gothic Metal e Black Metal mais cadenciado, partes melódicas e atmosféricas que vem do Heavy e Prog Metal mas a espinha dorsal é Doom.
As letras do Deep Memories são muito inteligentes e um tanto complexas, muito profundo também, pois as letras viajam pela psique humana. Pelo que li você explora de forma muito aprofundada as nossas lembranças e suas consequências como seres humanos… Nos fale mais sobre a veia lírica/ideológica… Você estudou psicologia? O que ou quem te influenciou para explorar tal lirismo?
Douglas Martins – Como disse no começo da entrevista vivi alguns momentos bem difíceis na minha vida e a falta de aceitação destes momentos geraram feridas que nunca cicatrizavam, a cada nova “pancada” estas feridas se abriam e sangravam novamente. Percebi que entrar em contato com estas memorias de maneira profunda e estruturada, listando-as e falando sobre elas, desarmava algumas reações padronizadas da minha personalidade: Identificar que eu poderia mudar uma reação descontrolada ou dolorosa gerada pela associação inconsciente ao passado fez toda a diferença na reestruturação da minha vida. Gosto muito de psicologia, principalmente Carl Jung mas não tenho formação acadêmica nesta área.
Gostaria de destacar que com o Deep Memories não existe uma questão ideológica, adotei esta abordagem em algumas músicas pois acho interessante e faz parte do meu cotidiano, mas não tenho a pretensão de erguer uma bandeira. Hoje tenho a liberdade de escrever o que acho relevante e interessante sem estar preso a uma ideia central, tanto que as cinco primeiras músicas do álbum contam a estória de um cara que se vê em seus últimos instantes de vida e acaba por morrer. Para sua surpresa identifica sua consciência intacta no post mortem, além de várias outras situações inusitadas que o apresentaram uma nova perspectiva da existencia humana.
A banda é como chamamos “One Man Band”, ou seja, você sozinho gravou todos os instrumentos. Por que sozinho?
Douglas Martins – Fazer um álbum inteiro sozinho sempre foi um sonho que tive. Todas as vezes que ouço o Twilight of the Gods do Bathory fico muito impressionado de como um álbum tão espetacular daquele foi gravado por um único cara! Já tinha uma tonelada de material em mãos e ainda não tinha tido “coragem” de encarar esta jornada. Quando comecei, dei de cara com um turbilhão de sentimentos que naturalmente migraram para os sons e isso acabou me impulsionando muito. O que no começo foi algo despretensioso se tornou sério, fiquei diversos finais de semana com o fone de ouvido e valeu a pena cada segundo. Quando finalizei a masterização fiquei 3 semanas sem ouvir o álbum. Quando eu ouvi novamente, foi algo inexplicável! Um álbum inteiro, pronto para ser lançado… Foi um momento inesquecível!
Voltando a falar da veia musical do Deep Memories, notei também que além de influencias das tradicionais bandas de Doom Metal, você ousou uma usar alguns elementos diferenciados como progressivo. Quais são suas influencias musicais?
Douglas Martins – Minhas principais influencias navegam pelos gêneros e subgênero do metal. Dentro da levada mais cadenciada, que mescla Death, Doom, Gothic e Post Rock bandas como Amorphis, Katatonia (todas as fases), Tiamat, My Dying Bride, Anathema (todas as fases), Theatre of Tragedy e Within Temptation me influenciaram e ainda influenciam pois ouço com muita frequência.
Já no Death e Black metal citaria o Dimmu Borgir, In Flames (primeiros álbuns), Death, Aeternus, Dark Tranquillity, Hypocrisy, Dismember, Bathory, At The Gates e Rotting Christ como as principais influências.
Dentro do progressivo minha maior influência sempre foi o Pink Floyd. Quando era criança me lembro de meu pai assistindo ao show “Delicate Sound of Thunder” que eu não conseguia assimilar muito bem, mas hoje vejo como fez e ainda faz parte da minha formação musical – David Gilmour toca com a alma! Já no Prog Metal a principal influência é Dream Theater, já os vi ao vivo duas vezes e acompanho desde que sou moleque. Mas sem dúvidas minha maior influência no prog é o Iron Maiden. Sei que a maioria estranhou esse meu comentário, mas eu particularmente vejo boa parte da obra deles como metal progressivo. Se você ouvir músicas como “To Tame A Land”, “Rime of The Ancient Mariner” e “Alexander the Great” entenderá do que estou falando. Esta para mim é a maior de todas as bandas, não há ninguém como o Iron Maiden.
O Debut “Rebuilding The Future”, álbum que tive o prazer de ouvir e comentar aqui para os nossos leitores, está com data marcada para o seu lançamento em 21 de setembro deste ano. O que os seus fãs encontrarão neste álbum? O que nos diz?
Douglas Martins – Encontrarão um material que mescla muito bem o metal dos anos 90 com uma sonoridade moderna, vocais brutais mesclados com corais e vocais limpos, diversos duetos de guitarra, um baixo marcante e pesado, boa presença de teclados, narrações, partes de guitarra limpa… uma atmosfera bem viajante, pesada e marcante.
Esta banda com certeza nasceu fadado ao sucesso. O Debut será lançado além de aqui no Brasil pelos grandes selos “Heavy Metal Rock e Misanthropic Records”, também será lançado na Rússia e no Japão. Um feito extraordinário para o primeiro álbum de uma banda brasileira. Como surgiu o interesse destes selos internacionais pela música do Deep Memories?
Douglas Martins – Ao concluir o álbum e acertar com a Heavy Metal Rock e Misanthropic Records iniciei a batalha por um selo fora do país. Entrei em contato com muitos selos. Hoje a internet facilita isso. Tive o privilégio de fechar com mais dois selos sendo o Invasion of Solitude Records, um selo japonês especializado em Melodic Death Metal – eles lançaram o Myrkgand recentemente; na Russia assinei com a GS Productions que já lançou o Eternal Sorrow. Isto sem dúvida me motivou muito e também mudou a maneira de guiar o projeto. Passei a contar com o espetacular apoio das assessorias de imprensa Metal Media de Mococa e Against PR de Portugal, informando a galera e a imprensa em geral sobre os caminhos do Deep Memories aqui no Brasil, Europa, Asia e EUA. Também decidi lançar o álbum em todas as plataformas digitais como Spotify, Deezer, iTunes, Google Play entre outras.
Em nossa opinião, você conseguiu uma identidade única à banda e mesmo tão nova se tornará um referencial para o estilo. Quais as suas aspirações junto ao Deep Memories? E o que você espera para o futuro?
Douglas Martins – Agradeço muito a você Éden e Roadie Crew pelo apoio e palavras sobre a sonoridade do Deep Memories! O que almejo com este álbum é consolidar um caminho para este projeto, levar estas músicas ao maior número de pessoas que curtem metal e firmar o nome do Deep Memories no metal nacional e nos países em que o álbum foi lançado.
A capa do Debut será diferente para o lançamento japonês, qual o motivo para esta decisão?
Douglas Martins – Inicialmente eu ia usar a capa feita pela CadiesArt para todos os lançamentos, mas quando comecei a trabalhar no encarte do álbum acabei fazendo uma capa alternativa que gostei bastante, mostrei para os amigos mais próximos e todos também curtiram. Então veio a ideia de deixar uma das capas para o Japão e a outra para os demais países e assim seguimos. Para este álbum eu não gravei nenhum bônus track, mesmo porque nem imaginava à proporção que tudo tomaria. Depois de fechado com os quatro selos, cheguei a pensar em gravar mais dois sons para esta finalidade pois ainda haviam restado a estrutura de 4 sons, mas percebi que o álbum “Rebuilding the Future” era composto por 8 músicas. Poderia soar forçado, e por isso decidi não fazer.
Explique para os nós e nossos leitores a concepção das capas…
Douglas Martins – As capas visaram demonstrar a ideia de “Reconstrução do Futuro”. Quando pensamos neste quesito, naturalmente refletimos onde estamos, onde podemos chegar e o que precisamos fazer para muda-lo. Se observar bem as duas capas perceberá que as imagens nos passam uma progressão – do passado para o futuro, ilustram a transcendência de patamares, mostrando uma evolução…, porém dar mais detalhes seria “induzir” a interpretação de quem as observa, gostaria que cada pessoa tivesse a sua interpretação, observando as capas se fazendo a seguinte pergunta: “O que eu faria para reconstruir meu futuro? ”
Mudando um pouco de assunto, vou te fazer uma pergunta comum em minhas entrevistas. Como você encara a cena atual aqui no Brasil?
Douglas Martins – Vejo a cena bem sólida com ótimas novas bandas progredindo ao lado de bandas com mais de 20 anos de atividade. Excelentes materiais sobre o metal nacional estão bem mais acessíveis. Teve uma natural profissionalização do conteúdo underground se comparado aos anos 80 e 90 com espetaculares zines e webzines, vários novos blogs, canais do YouTube que apresentam novas bandas, clipes, entrevistas, uma infinidade de playlists nas plataformas de streaming sobre metal brasileiro, enfim, a internet mudou nossa maneira de ver o mundo e mudou para sempre o movimento metal também. Antes ouvíamos os álbuns do Iron Maiden, Kiss, Judas Priest e Sepultura sem as vezes conhecer outras fotos além daquelas impressas nos encartes do vinil. Hoje com um simples clique você acessa a enciclopédia metal que tem toneladas de bandas. Se digita no Google, Facebook ou Instagram as palavras “metal extremo” verá a quantidade de material que aparece. Ampliando este mesmo raciocínio para o metal a nível mundial, quando comecei a curtir metal extremo na metade nos anos noventa, eu não sabia se a maioria destas bandas tinham videoclipes ou shows ao vivo, somente quando alguém comprava alguma VHS importada ou copiava de alguém da capital. Muitas bandas que conheci foram através de trocas de K7s por carta, então a internet veio para encurtar as distancias e facilitar a divulgação. Com isso, aqui no Brasil muitos que antes não tinham voz passaram a ter seu espaço, é logico que mais disputado que antes, mas todos temos a liberdade de expor nossa paixão que é o metal de maneira pública. Para aqueles que apreciam e acompanham as novidades do cenário underground isto com certeza ajudou muito.
Você além de ser um músico e compositor exímio, você também é produtor musical, estou certo? Está trabalhando em mais alguma produção?
Douglas Martins – No momento não estou trabalhando na produção de nenhuma banda mas tenho 2 trabalhos bem encaminhados para início da produção até o final deste ano. Estes convites me deixaram bem surpreso! O pessoal ouviu o Deep Memories e me procurou para produzir seus trabalhos. Isto é uma enorme realização pessoal porque este lance da produção já vem de anos, sempre gostei de interagir com equalizações, mixagens e coisas do gênero. Minha primeira experiência profissional foi com este álbum do Deep Memories e espero que muitos novos trabalhos surjam pois quando estou envolvido em uma produção, me vejo realizado plenamente. É trabalho duro, horas de dedicação, o limite sempre sendo testado, mas o resultado final vale a pena.
Meu amigo Douglas Martins, agradeço demais o seu tempo cedido a esta entrevista muito esclarecedora e desejo que o Deep Memories vá cada vez mais longe. Você merece. Conte sempre conosco… O espaço é seu…
Douglas Martins – Meu brother Éden, agradeço imensamente por estas excelentes perguntas! Sempre acompanhei a Roadie Crew ao longo dos anos e gostaria de parabeniza-los por sustentar a chama do metal acesa por tanto tempo! Para mim é uma honra incrível saber que tão conceituado veículo de comunicação abriu as portas para o Deep Memories! Muito obrigado!
Aos amigos que tem acompanhado o Deep Memories nos últimos meses dia 21 de setembro o álbum enfim estará disponível. Agradeço todas as mensagens, compartilhamentos, comentários e feedbacks que tenho recebido. Não tenho palavra para agradece-los! Em novembro estaremos lançando nosso segundo lyric vídeo que além da letra, terá imagens do Deep Memories. Valeu!
Enquanto esperamos ansiosamente o lançamento do álbum “Rebuilding The Future”, trazemos aqui a “The Bitter Taste Of Illusion” do maravilhoso EP “In Too Deep…”. Assistam e ouçam:
https://youtu.be/vCNReRnodtM