Parte extremamente importante para o desenvolvimento do heavy metal como um gênero musical vivo e vibrante é a eterna renovação do cenário, algo que vem sendo promovido diariamente por novos músicos e novas bandas que (felizmente) não se cansam de lançar novos projetos musicais. Multi-instrumentista, mas com uma paixão evidente pela guitarra, Zeke Sky iniciou sua trajetória musical em 2018, quando lançou de forma independente o álbum Animals Of God & War. Desde as primeiras notas percebe-se um músico confiante e talentoso, que não poucas vezes ruma para algo bastante virtuoso, mas que em nenhum ponto aposta todas as suas fichas nisso. Pelo contrário, é no equilíbrio e na variedade de elementos que ele ganha seus pontos, algo que é ainda mais evidenciado neste segundo álbum, Intergalactic Demon King (2022), o primeiro por um grande selo internacional. Conversamos com o músico, que nos contou como tem sido o seu caminho até aqui.
Tanto quando vi a capa de Animals Of God & War (2018) quanto quando vi a capa do novo Intergalactic Demon King, inicialmente imaginei que se tratasse de álbuns de power metal, por conta desse toque de Fantasia que ambas as artes trazem. Você é fã de literatura de Fantasia?
Zeke: Sim, Fantasia sempre me atraiu, mas a verdade é que História sempre me cativou mais. Então, para mim, sempre foi um equilíbrio entre esses dois universos, algo que só poderia acontecer em um mundo de Fantasia, e coisas que de fato aconteceram no nosso passado, amo essa mistura. Então, inegavelmente existem elementos de Fantasia ao longo desses dois álbuns, mas acho que a maior parte das histórias narradas no álbum são baseadas em eventos que realmente aconteceram e que fazem parte da História do mundo, são coisas que tive meus primeiros contatos ainda nos tempos de estudante e tal. Quanto as capas em si, elas ficam muito mais chamativas com todos esses elementos que remetem a filmes, desenhos e revistas em quadrinhos de Fantasia, e acredito que você tenha imediatamente associado com uma banda de power metal porque ao longo dos anos essas bandas quase que asseguraram uma espécie de ‘monopólio’ sobre esses temas (risos).
É verdade, mas eles nem sequer foram os primeiros, certo?
Zeke: Exato, eu estava pensando exatamente nisso agora! Essas capas bonitas e chamativas e até mesmo as letras evocativas e cheias de ambientes viraram uma marca do power metal há bastante tempo, mas ainda muito antes elas já eram usadas por bandas de outros gêneros, especialmente por grupos de rock progressivo, que traziam ainda mais profundidade a esse universo lírico e visual. Até hoje eu amo ficar olhando para aquelas capas icônicas dos álbuns do Yes e do Eloy, entre tantos outros. Sem contar tantas outras, Uriah Heep, Blue Öyster Cult e até formações de outros gêneros, então a genealogia dessa mistura de música e fantasia vai muito, muito longe mesmo!
É verdade, e é engraçado pensar o quanto a arte de Roger Dean tem a ver com a música que ouvimos desde então, o quanto a arte dele influenciou tudo o que viria depois, até no metal extremo.
Zeke: Sim, é isso mesmo. Ele fez tantas capas incríveis para o Yes, Asia, Uriah Heep, e todas elas ficam gravadas na memória assim que a gente vê pela primeira vez. É engraçado pensar que eu nunca comprei um CD em toda a minha vida, e ainda assim aquelas capas estão gravadas na minha memória, então é fácil perceber o poder que elas têm. E também é legal perceber a conexão intensa que aquelas artes têm com a música que o Yes estava desenvolvendo naquela época. Tanto a arte quanto a música eram tecnicamente complexas e perfeccionistas, além de que pareciam vibrar na mesma sintonia. O Yes tem algumas das melhores capas nos seus álbuns, e os seus álbuns contém algumas das melhores canções, algumas das melhores melodias que já foram gravadas.
E ótimas letras.
Zeke: Ah sim, não podemos esquecer disso! Eram tão profundas, algumas das melhores que já ouvi, tinha algo de filosófico, algo de fluxo de consciência, eram letras realmente bem meditativas, eu adorava, ainda adoro! Eu gostava muito dessa coisa deles abordarem de forma bastante subjetiva o subconsciente como um lugar para onde você pode viajar quando quer sentir uma determinada emoção, quando quer sentir uma experiência além do tempo, incorpórea. É, eu sei que é uma viagem, mas é uma viagem embalada em ótima música (risos).
Bem, a sua música já havia me mostrado que você tem referências do prog rock, mas nem imaginava que elas fossem tão profundas quanto percebo nessa conversa.
Zeke: Ah, eu amo progressivo! Sendo bem sincero com você, acho que os discos de rock progressivo dos anos 70 são os mais importantes para mim como músico, acho que foi com eles que realmente aprendi a tocar! Eu ficava ouvindo aquelas canções e tentando imaginar como tocar cada parte, e quando descobria como executar com perfeição o lado técnico, ficava me debruçando ainda mais sobre a música para encontrar a emoção correta, pois no prog só a técnica não basta, você precisa encontrar o sentimento correto para cada parte de uma canção. Muitos daqueles discos ainda estão gravados na minha mente, sem contar que o rótulo ‘progressivo’ te oferece liberdade para trabalhar praticamente qualquer elemento, de qualquer tipo de música.
É verdade. E como você estava dizendo, na sua música você gosta de pegar elementos da História e mesclar com um pouco de fantasia, um recurso que os grandes autores do gênero também adoram usar.
Zeke: Sim, até porque esses caras, J.R.R. Tolkien, Joe Abercrombie e tantos outros, eles precisavam ter um ponto de partida para começar o seu trabalho, eles precisam de algo que ao menos apontasse uma direção. De certa forma, podemos olhar para Heródoto como o primeiro grande autor de Fantasia, pois na sua História ele trazia todas aquelas descrições vibrantes e detalhadas de acontecimentos fabulosos, o rei que queima todos aqueles tesouros no topo da torre do seu castelo enquanto questiona onde falhou poderia ser comparado ao rei que enlouquece e se atira às chamas em O Senhor dos Anéis. O ser humano muito naturalmente ama História, e acredito que é só a manipulação dela em favor do interesse de certos grupos que faz tantos acabarem se afastando dela.
Bem, a banda Zeke Sky nasceu em 2018, certo?
Zeke: Mais ou menos. Foi em 2018 que minhas primeiras músicas foram lançadas, até então as coisas eram meio soltas, eu não estava compondo seriamente antes, mas já tinha participado de alguns eventos, principalmente tocando covers, mas eu realmente queria uma banda. Eu escrevia alguns trechos de música, mas não sabia exatamente o caminho que queria seguir, então fui fazendo aos poucos. Em 2018 decidi mostrar algumas músicas, comecei então a trabalhar com as ferramentas que tinha em mãos, divulgando em mídias sociais. De fato, no começo eu fazia basicamente vídeos meus tocando algo e postava nas redes sociais, esse foi o começo de tudo. Comecei usando o nome Zeke Sky Band, mas logo depois reduzi para apenas Zeke Sky.
Imagino que tocar vários instrumentos tenha sido fundamental para alcançar o resultado que queria.
Zeke: Sim, e acho que uma das principais razões disso ajudar é que quando está criando, você ‘ouve’ melhor as canções na sua cabeça quando toca vários instrumentos, pois tem uma ideia bem precisa de como cada um deles soa. É diferente de quando você é um guitarrista e não faz ideia de como um teclado realmente soará, ou quando é baixista e nem imagina como a guitarra deverá entrar em certa parte, etc. A sua visão fica, ao mesmo tempo, mais clara e mais ampla quando domina mais recursos. Cada instrumento tem a sua própria linguagem, e quando você ‘fala a língua’ de cada instrumento, consegue um melhor resultado na hora de comunicar as suas ideias através deles.
Hoje, como você vê o seu primeiro registro, Animals of God & War (2018)?
Zeke: Em primeiro lugar, é muito difícil para as pessoas encontrar aquelas músicas em algum lugar, pois não é algo feito profissionalmente como esse novo, e isso talvez não seja um grande problema (risos). Eu vejo aquele primeiro registro como algo muito experimental, eu estava literalmente experimentando coisas, fazendo pequenos testes naquelas músicas. Bem, com aqueles vídeos que vinha publicando nas minhas páginas pessoais, tinha desenvolvido uma pequena base de seguidores na internet, e queria oferecer algo para essas pessoas, e foi basicamente por isso que fiz aquele disco, algo bem diferente do que alcancei neste novo álbum, que trabalhei de forma bem mais profissional.
Imaginei que diria algo assim, já que Intergalactic Demon King soa como uma unidade sonora muito firme. E ela é basicamente a sua visão musical em todos os aspectos, certo?
Zeke: Exatamente. Não quero ser visto como um tirano ou um ditador, mas essa banda é coisa minha, é o meu nome que está ali, então as coisas são feitas do meu jeito. Tudo o que você ouve em Intergalactic Demon King é criação minha, claro que meu baterista (Adam Pierson) adicionou algum ‘feeling’ aqui e ali, mas eu compus todas as linhas de todos os instrumentos e gravei todos eles em demos antes de entrarmos em estúdio, então estava claro como tudo deveria soar, inclusive a bateria. Também escrevi todas as letras, então posso dizer que este álbum é exatamente o que gostaria de ter feito, em todos os aspectos, já que me esforcei para estar adiante de tudo.
Dito isso, você já pensa em novas canções?
Zeke: Sim, estou constantemente tendo ideias, mas ainda é cedo para começar a pensar mais seriamente em um novo registro. Por enquanto estou vivendo o que o álbum atual tem a oferecer, curtindo o momento, mas sem dúvida esse é um projeto que terá continuidade em breve, então podem contar com isso!